Projeto de divulgação da memória do Marabaixo, maior tradição cultural do Amapá

quinta-feira, 5 de maio de 2016

Tia Biló em noite inspirada na Quarta da Murta do Laguinho (veja vídeo)

Quem frequenta as festas de Marabaixo no Centro Cultural Tia Biló, à rua Eliezer Levy, quase esquina José Tupinambá, no bairro do Laguinho, em Macapá, já se acostumou a ver a própria Tia Biló, 91 anos, acompanhando a festa, sentada em sua cadeira junto à parede da sala onde ficam guardadas as coroas do Divino Espírito Santo e da Santíssima Trindade. Sempre elegante, com sua flor no cabelo e vestida com as cores escolhidas pela Associação Cultural Raimundo Ladislau para as festas de cada ano, raramente Tia Biló aproveita o momento da festa para entoar ladrões de Marabaixo. Uma das ocasiões recentes em que isso aconteceu, aliás, coincidiu com minha presença junto com a equipe da Graphite Comunicação, em pleno encerramento do Ciclo do Marabaixo de 2014, e deu origem a meu curta-metragem Tia Biló, incluído no ano passado no acervo itinerante do FestCineAmazônia, de Porto Velho. 

Por isso, foi uma grande surpresa quando ontem, após cantar "É de manhã, é de madrugada", o mesmo ladrão registrado no curta, Tia Biló seguiu cantando uma verdadeira antologia de clássicos do Marabaixo, ao longo de quase duas horas - passava um pouco das 19h30 quando ela começou a cantar, e só por volta de 21h30 seu bisneto, Iury Soledade, assumiu o comando da roda. O feito é notável sob todos os aspectos, afinal estamos falando de uma pioneira do Marabaixo no tradicional bairro do Laguinho; única filha viva de Mestre Julião Ramos, Benedita Guilherma Ramos há 57 anos comanda, nessa mesma casa, os festejos do Ciclo do Marabaixo. 

Durante todo o tempo que tia Biló cantou, numa noite de Quarta-Feira da Murta do Divino Espírito Santo (festa que só acaba ao amanhecer, com o levantamento do mastro em honra ao Divino), os tocadores da Associação Raimundo Ladislau e os da visitante Associação Raízes da Favela permaneceram em volta da cadeira da matriarca, dispostos num semicírculo, claramente indicando uma deferência ao momento tão especial, já que o usual é que os tocadores, juntamente com dançadores e dançadeiras, dancem em círculos pelo salão, no sentido anti-horário. Outra providência adotada especialmente para o momento ímpar foi o cadenciamento das caixas de Marabaixo, que eram tocadas mais suavemente enquanto Biló cantava os versos dos ladrões, e mais forte no momento em que cantadores como Munjoca Ramos, Alan Cruz, Iury Soledade, Wendel Santos, Fábio Sacaca, Cássia Pechorz e até a ultrajovem Victória Congó (5 anos) respondiam no coro. 

Entre os sucessos interpretados por Tia Biló, podemos citar "Aonde Tu Vai, Rapaz?", "Irmã Catita", "Lírio Roxo", "Nêgo" e "Guadariõ - nestes últimos, Iury começou a dividir o vocal com sua bisavó, vindo em seguida a assumir o comando da roda, já no formato tradicional que é tão peculiar do Marabaixo em que cantadores, tocadores e dançadeiras rodam continuamente (em outras danças, o mais comum é que quem toca não dance ao mesmo tempo). 

Ao longo destas duas horas, várias pessoas estiveram gravando ao menos parte do canto de Biló - até uma equipe de reportagem da TV Amapá se fez presente em dado momento. Das 1h15 que gravei em vídeo (até que a imprevisível bateria da minha filmadora de bolso me deixou na mão, quando então recorri ao gravador de voz de meu celular), selecionei para dividir com vocês hoje este momento em que Tia Biló canta um ladrão de sua madrinha, Tia Zefa, que há pouco, em 26 de fevereiro, completou 100 anos (sim!!) - trata-se de "Mamãe, Minha Rica Mãe". Uma bela amostra de uma noite que não será esquecida tão cedo! 




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